135 bilhões de dólares americanos foi o valor do mercado de games em 2018. Bobby Kotick sozinho, CEO da Activision-Blizzard, fez 28,6 milhões de dólares no ano passado. Esses números são grotescos e reafirmam o que muitos já diziam: videogames se tornaram coisa séria, muito séria. Porém, existe uma fatia dessa indústria que parece não estar recebendo os devidos créditos. Como em todo meio criativo que desperta paixões, nos games também não é incomum que empresas e patrões se aproveitem de forma não tão ética da mão de obra que cria essas verdadeiras obras de arte. A industria tem mantido práticas desleais, salário baixo e condições precárias. A solução, cada vez mais, parece ser os sindicatos.
Red Dead Redemption 2, Anthem e Dragon Age: Inquisition tem algo muito ruim em comum: todos foram desenvolvidos em cima de uma cultura de irresponsabilidade com os trabalhadores. Na Rockstar, desenvolvedora de RDR2, foi comum trabalharem 100 horas por semana próximo à data de lançamento; a BioWare com Anthem, como já mostrado aqui neste site, jogou no lixo anos de pré-produção para largar tudo no colo dos funcionários durante o ano final para entregar um jogo praticamente do zero. Diversos relatos na internet falam do estresse de se trabalhar na indústria, de como o sonho vai pelo ralo, do quanto os funcionários são afastados por licença médica e da falta de proteção contra assédio e ameaças.
Além de todas as condições precárias e de pressão em que muitos desenvolvedores trabalham, ainda há o fato de que a discrepância salarial é gigante e muitos se sentem desmotivados a continuar. O pessoal de controle de qualidade, por exemplo, que testa os jogos, os sistemas e mecânicas ao longo de toda a produção para identificarem problemas e diminuírem as chances de um produto defeituoso, ganha, em média, 10 dólares por hora. Enquanto isso, diretores ganham dezenas de milhões. O CEO da Blizzard ganha 306 vezes mais do que a média salarial de toda a empresa, incluindo os funcionários de alto escalão.
Não bastasse a diferença salarial e as condições muitas vezes inumanas a que empregados são submetidos, a cultura de freelance que perpassa muitos ramos das artes ainda gera um cenário constante de instabilidade para esses trabalhadores. A EA Games recentemente demitiu cerca de 350 funcionários pelo mundo, enquanto que a Blizzard, mesmo batendo recorde histórico de lucro, demitiu 770 empregados. Esses casos grandes e algumas outras demissões em estúdios menores somaram milhares de novos desempregados no setor só nos três primeiros meses de 2019.
A The American Federation of Labor and Congress of Industrial Organizations, maior central sindical dos EUA, enviou neste ano uma carta aberta convidando os trabalhadores da indústria de videogames a se juntarem. Outra iniciativa interessante foi a Game Workers United que procura juntar interessados na sindicalização dos desenvolvedores. Jornalistas de todo o mundo estão cada vez mais levantando a bandeira da união e apontando os abusos e problemas da indústria. É válido lembrar que os EUA, Canada e alguns outros países não possuem uma consolidação de leis trabalhistas robusta e, na maioria dos casos, não resta outra opção a esses empregados a não ser a força sindical – até mesmo para pequenas melhorias nas condições de trabalho. O amor pelos games não pode ser razão para maus tratos aos criadores dos nossos jogos preferidos.